Declaração de insolvência e acções declarativas pendentes

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2014
 

Supremo Tribunal de Justiça
Transitada em julgado a sentença que declara a insolvência, fica impossibilitada de alcançar o seu efeito útil normal a acção declarativa proposta pelo credor contra o devedor, destinada a obter o reconhecimento do crédito peticionado, pelo que cumpre decretar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do art. 287.º do C.P.C.

Abuso de Direito - Aval Prestado em Livrança em Branco para Garantia de Conta Caucionada

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11/12/2013 no processo 1464/11.2TBGRD-A.C1.S1

Sumário:

I - A proibição do comportamento contraditório configura actualmente um instituto jurídico autonomizado, que se enquadra na proibição do abuso do direito (art. 334.º do CC), nessa medida sendo de conhecimento oficioso; no entanto, não existe no direito civil um princípio geral de proibição do comportamento contraditório.

II - São pressupostos desta modalidade de abuso do direito – venire contra factum proprium – os seguintes: a existência dum comportamento anterior do agente susceptível de basear uma situação objectiva de confiança; a imputabilidade das duas condutas (anterior e actual) ao agente; a boa fé do lesado (confiante); a existência dum “investimento de confiança”, traduzido no desenvolvimento duma actividade com base no factum proprium; o nexo causal entre a situação objectiva de confiança e o “investimento” que nela assentou.

III - O princípio da confiança é um princípio ético fundamental de que a ordem jurídica em momento algum se alheia; está presente, desde logo, na norma do art. 334.º do CC, que, ao falar nos limites impostos pela boa fé ao exercício dos direitos, pretende por essa via assegurar a protecção da confiança legítima que o comportamento contraditório do titular do direito possa ter gerado na contraparte.

IV - Actua com abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprium, o banco que acciona uma livrança, que os executados avalizaram em branco, oito anos depois de estes se terem afastado da sociedade subscritora, na qual tinham interesse, tendo o exequente conhecimento que estes só avalizaram a livrança por serem pessoas com interesse na sociedade subscritora, sendo que, na altura do afastamento (meados de 2003), a conta caucionada de que a sociedade era titular encontrava-se regularizada e, posteriormente (já depois de 2004), o exequente, sabendo que os executados se sentiam desobrigados e que era bastante a garantia dos restantes avalistas, continuou a conceder crédito à sociedade através da renovação do contrato de abertura de crédito que tivera início em 03-07-2002.

V - Perante estes dados de facto, verifica-se que os executados podiam fundadamente confiar que, tanto tempo depois de se terem apartado da sociedade subscritora, o banco não accionaria o aval que prestaram: é inadmissível e contrária à boa fé a conduta assumida pelo exequente, na exacta medida em que trai a confiança gerada nos executados pelo seu comportamento anterior, confiança essa objectivamente reforçada pelo decurso de um tão dilatado lapso de tempo.

 

 

Disponível em fonte aberta no sítio da DGSI em www.dgsi.pt

Deliberações sociais inválidas

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 31-10-2013 no processo 1317/12.7TYLSB-A.L1-2

Sumário:

I. A procuração outorgada para efeitos de representação voluntária, também designada por “carta mandadeira”, que não especifica as formas de deliberação abrangidas pela representação, é válida apenas para as assembleias gerais regularmente convocadas.

II. Perante a invalidade da procuração para representação de outro sócio, este falta à assembleia geral, não convocada, sendo nulas as deliberações sociais tomadas, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 56.º do Código das Sociedades Comerciais.

III. Os bons costumes reflectem as regras dominantes da moral social de uma determinada época e certo meio, abrangendo o conjunto de regras éticas aceites pelas pessoas honestas, corretas e de boa fama.

IV. A invalidade, por anulação, da deliberação social abusiva está dependente de um pressuposto de natureza subjectiva e de outro de natureza objectiva.

V. O primeiro pressuposto consiste na intenção ou vontade de obter vantagens especiais, materiais ou de outra natureza, ou de causar prejuízos à sociedade ou aos sócios minoritários.

VI. O segundo pressuposto traduz-se na adequação ou aptidão da deliberação social para alcançar o propósito ilegítimo pretendido.

VII. Não são abusivas as deliberações sociais que aprovam a nomeação de gerente, ainda que da confiança do sócio minoritário, e a alteração do pacto social, sem prejuízo da participação social existente.

VIII. As deliberações sociais causam um dano apreciável, quando é nomeado um gerente alheio à vontade do sócio maioritário, em sociedade com apenas dois sócios, e é aprovada uma alteração estatutária que modifica as regras de obtenção da maioria para certas matérias, com prejuízo da posição do sócio maioritário.

 

Disponível em fonte aberta no sítio da DGSI em http://www.dgsi.pt/